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quinta-feira, 22 de abril de 2021

ÉDIPO GRITANTE

 

Édipo Gritante

O que fazer quando ele vê na própria mulher

uma projeção de sua mãe? 

Um casal recém nupciado tem por obrigação de atentar para o excesso de influência de ambas famílias no casamento ainda em fase de consolidação. Não podemos escolher as famílias das quais somos oriundos, porém, devemos cuidar para que as interferências excessivas construam um desagradável cavalo de tróia em nossas vidas enquanto casal.

A inexperiência e insegurança no início da construção do lar, nos leva a ser submetidos às ditaduras de sogras, irmãs mais velhas, cunhados, primas, primos, vizinhos e toda uma gama de “consultores matrimoniais”, que não desgrudam do casal de uma maneira geral.

O sentimento de pertencimento a uma família é muito importante para nós seres humanos. Em um mundo cada vez mais excludente e egoísta, onde a solidariedade passou a ser uma virtude e não um comportamento natural dos seres humanos, é na família onde encontramos o aconchego e a proteção necessária para seguirmos em frente na dura lida do cotidiano. Porém, Esse sentimento gregário e virtuoso, só tem sentido e se torna gratificante quando os espaços de cada um são respeitados, principalmente quando estamos mais fragilizados ou nos sentindo inseguros em relação à vida, como é o caso do casamento em seus anos iniciais.

A realidade é uma música que nos obriga a dançar, saibamos ou não. Ela nos mostra que o lugar mais difícil para alcançarmos não é o topo do Monte Everest ou o lugar mais profundo dos oceanos. A vida insiste em nos apontar e nós insistimos em não lhe dar ouvidos, que o lugar mais difícil de nos colocarmos é o lugar do outro.

Na intrigante dialética entre o ‘certo e o errado’, a mulher geralmente é o elo mais fragilizado da corrente. Sobre seus ombros recai a responsabilidade da garantia de sucesso do casamento, da vida a dois, da garantia de um lar bem sucedido. Por mais que a mulher se esforce no desempenho da ‘missão’, o patriarcado jamais lhe dará trégua no em todo o seu decorrer.

Os homens geralmente são criados pelas mulheres, por suas mães. Os pais estão sempre envolvidos em ‘coisas de homem’, como boteco, futebol e fuçando as entranhas de seus carros e motos. As mulheres com seu amor incomensurável, criam seus meninos como verdadeiros príncipes e é assim que costumam chamá-los. Sempre serão os mais lindos, mais fortes e mais inteligentes. Deverão encontrar um mundo ameno e acolhedor e mais, uma mulher que satisfaça todos os seus desejos. É assim que o meninão é entregue para o casamento, um ‘presente’ criado e cuidado com todo o carinho desse mundo, que terá a missão de gerar netinhos e netinhas para a preservação atávica do bom nome da família.

A mulher sempre será vista com desconfiança. Ao ‘surrupiar’ o varão do lar aconchegante e protetor que sempre teve. Algumas matriarcas consideram a decisão do casal de morar em outra residência que não a dela como ‘apropriação indébita’ do seu amado filho pela nora egoísta e dominadora.

Então a mulher será responsável pela carga pesada de manter o casamento no rumo certo, de acordo com as diretrizes da família de seu marido. Qualquer estremecimento na relação com o marido será suficiente para que haja uma intensa mobilização contra a usurpadora. As decisões do casal devem ser muito bem pensadas para que a vida de casal não se trone um fardo difícil de carregar. Sabemos que não é fácil a união de dois espíritos e corpos em uma construção onde as chances de êxito são desconhecidas e sem garantia. Porém, o tempo de convívio anterior ao matrimônio, apontou para uma razoável possibilidade de sucesso, que dependerá do equilíbrio de um sistema delicadíssimo onde pesos e contrapesos emocionais estarão interagindo sempre na direção das expectativas do casal. A realidade nos mostra que os indicadores de sucesso nessa empreitada não é muito animador. Poucos casais se mantêm juntos por mais de 15 anos de convívio.

O homem sempre casa sabendo que terá para onde retornar caso o infortúnio da separação recaia sobre ele. A casa materna sempre será seu porto seguro, que fortalecido pelo Complexo de Édipo, não investirá pesadamente na manutenção do casamento, deixando a parceira sempre insegura em relação ao futuro da união.

Em muitos homens o édipo é tão arraigado que ele solicita que sua mulher e companheira faça as demandas cotidianas exatamente como sua mãe fazia. A comida, o modo de tratar a roupa, o trato com os amigos e coisas afins.

Na tragédia de Sófocles, Laio Rei de Tebas consulta o Oráculo que lhe diz que seria assassinado por seu próprio filho e que este se casaria com Jocasta, sua esposa. Laio pega seu filho e o leva até uma densa floresta, onde prega seus pés com pregos para que não conseguisse fugir. O menino porém foi encontrado por um pastor de ovelhas que o salva e lhe dá o nome de Edipodos, ou pés-furados. Édipo acaba adotado pelo rei de Corinto e ao consultar o Oráculo recebe a mesma mensagem que seu pai. Pensando que assassinaria o rei de Corinto Édipo foge e acaba se envolvendo em uma briga com vários negociantes e mata o líder do grupo que vem a ser Laio, seu verdadeiro pai. Chegando a Tebas Édipo decifra o enigma da esfinge e rebe como prêmio o trono da cidade e sua rainha Jocasta em casamento. Anos depois descobrem a verdade e Jocasta se suicida enquanto Édipo fura os próprios olhos como auto-castigo por não ter reconhecido a própria mãe.

Assim continua sendo nas relações contemporâneas. A mãe disposta ao sacrifício da própria vida pelo filho enquanto ele fura seus olhos diante da responsabilidade de manter seu casamento e proteger sua companheira. Geralmente para evitar a morte lenta por desgosto da mãe, nosso Édipo moderno prefere dar fim ao casamento e retornar para sua Tebas tropical.

Para aumentar o caos de um casamento Jung nos brinda com o Complexo de Electra queé a disputa do amor do pai pela filha contra a mãe. O mito baseia-se em Electra, filha de Agamenon que tramou a morte de sua mãe Clitemnestra para vingar a morte do pai pelo qual era apaixonada.

Voltando ao casamento, nosso príncipe pode ser contaminado por este enorme labirinto existencial que poderá devorá-lo rapidamente, levando-o de volta para sua Jocasta.

Os sinais de que ele necessita de outra mãe, que sua esposa deve assumir esse papel é gritante e nosso Édipo não apaziguará a relação tensionada enquanto esses acordos não forem levados a termo. A mulher às vezes necessitando de colo de mãe terá que se tronar uma para aliviar as inseguranças do marido que agora já se tronou seu filho também.

Olhos furados para não encarar a situação e pés pregados para que não caminhe na direção da emancipação emocional do lar materno e da atmosfera protetora e acolhedora da mãe.

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