Um país continental como o Brasil, com tamanha desigualdade social e tanto por fazer para que atinjamos o grau de desenvolvimento, deveria debater nessas eleições, como organizar um conjunto de medidas que pudesse alavancar de vez nossa combalida economia.
Uma campanha política é um espaço privilegiado para debater com a população os grandes óbices que impedem o crescimento da nossa nação e, fundamentalmente, quais as medidas necessárias que devem ser tomadas para que essas assimetrias sociais sejam corrigidas.
A campanha política, durante seu período mais agudo, torna-se o ápice da dialética compreendida como primordial pela sociedade do território onde está localizada.
Os novos tempos trouxeram em seus ventos novíssimas modelagens tecnológicas que afetaram terrivelmente o modo de comunicação das campanhas políticas. Nos velhos tempos os militantes políticos se dirigiam para os portões das fábricas com seus panfletos antes do dia amanhecer. Batiam nos portões das casas nos bairros e percorriam as universidades fazendo o chamado corpo a corpo, olho no olho, visando o convencimento do voto.
A hegemonia do sistema liberal trouxe consigo avanços tecnológicos assustadores, na medida em que servem como instrumentos vitais para o avanço do capitalismo.
O impacto dessa nova configuração sistêmica na dinâmica das eleições foi a pulverização do modo antigo de fazer campanha. O corpo a corpo se tornou de tela a tela. As reuniões com grupos de cidadãos em um lugar comum transformou-se em “lives” temáticas. E os palanques foram transportados para refinadas peças de TV, com efeitos especiais, artistas e locutores profissionais.
A verdade nunca foi tão aviltada como nesse novo modelo de comunicação em campanhas eleitorais. Após o advento da pós verdade, tudo pode ser dito em nome de uma visão específica dos fatos e da decantada liberdade de expressão, agora transformada em biombo jurídico para um corolário de agressões verbais e acusações sem comprovação.
Levando em conta que o debate eleitoral deixou há muito a razão e as propostas sérias de gestão da nação, sobraram as patifarias e as mentiras apresentadas de maneira teatral. Jogando nesse nível, não há outra alternativa a não ser construir uma plataforma ideológica que passe longe das demandas estruturais do país e a ancore em uma pauta de costumes que abandona os avanços liberais e volta-se para o fundamentalismo religioso e o patriotismo exacerbado, que é um by pass atrativo para o fascismo.
Se uma foto do momento eleitoral brasileiro fosse feita nesse exato momento, teríamos entre os quatro principais candidatos uma escadinha ideológica, onde no primeiro degrau está o candidato de extrema direita com propostas fascistas. No segundo degrau encontramos uma herdeira do agro negócio, ruralista militante e adversária histórica da agricultura familiar. No terceiro degrau está um representante do coronelismo nordestino, travestido de democrata e no último e quarto degrau um ex-metalúrgico e ex-presidente da República de centro esquerda, que deixou o governo sob aplausos, com grande aprovação popular.
Nesse contexto, a postura ideológica dos principais candidatos a presidente da república, ou será um jogo de palavras ou mesmo um grande tratado de intenções generalistas.
No tabuleiro momentâneo dos jogadores, o movimento estratégico das peças são bastante coerentes, menos o de um player que é o Ciro Gomes.
Nas atuais eleições, Ciro é visto como o ornitorrinco, um mamífero que põe ovos, vice na terra e no mar e possui bico de pato. Em seu longo périplo por uma dezena de partidos, Ciro como Zelig de Woody Allen, vai adquirindo as características da agremiação quero recebe.
Ciro é um atento observador e profundo conhecedor das entranhas da política nacional. Foi Deputado Estadual, Prefeito de Fortaleza, Deputado Federal, Governador do Ceará, Senador e Ministro de Estado. Com todas essas credenciais, Ciro jamais conseguiu se eleger Presidente da República.
Talvez o insucesso de Ciro seja a ausência de ideologia. Em suas andanças pelo país apresenta um plano de desenvolvimento para o país, sendo que o livro é todo fruto de sua cabeça, não sendo um documento discutido pelas bases partidárias. Por não privilegiar as bases e sempre negociar com as cúpulas partidárias, falar-lhe apoio quando mais necessita, como é o caso agora, nessas eleições.
Com sua enorme expertise política, Ciro compreendeu que não tem passagem pela esquerda e que a pista da direita está congestionada e bloqueada por um enorme caminhão atravessado na via, chamado Jair Messias Bolsonaro. Simone Tebet é apenas e por enquanto um carro de pequena cilindrada que lhe ameaça mas não lhe ultrapassa.
Ao se sentir tolhido pelo cenário político mais tradicional por onde sempre trilhou, avistou no enorme sucesso de Bolsonaro com as massas uma alternativa para sair da sinuca de bico que ele próprio provocou e se meteu.
Patriotismo, pois quem gozando bem das faculdades mentais seria contra o patriotismo? Absolutamente ninguém. A vantagem de mergulhar no mar do positivismo é mandar a doutrina ideológica às favas. Basta tocar o hino nacional nos eventos em que participar, usar a bandeira nacional como capa vinculada ao fervor ideológico e manto protetor contra o comunismo.
Ciro enfim compreendeu que sua postura a partir de então será de nacionalista. O salvador da pátria, um verdadeiro cruzado contra os comunistas, contra políticas que atentem contra Deus, a Igreja e a família.
Para que sua protopolítica seja aceita e incorporada pela massa despolitizada que segue Bolsonaro, Ciro torna-se cada vez mais virulento em seus ataques ao ex-presidente Lula, inimigo mortal dos bolsonaristas. Ao atacar Lula, Ciro na verdade mira em Bolsonaro, pois como não consegue mais transitar pela centro-esquerda, optou em lançar suas tarrafas nos cardumes da extrema-direita.
Talvez Ciro em seus devaneios queira entrar para a história como o político que terçou armas pelo Brasil como nenhum outro. Um mix de Getúlio com Brizola, mas para isso terá que comer muito feijão. Primeiro porque tem um paredão enorme lhe desafiando chamado Bolsonaro e por outro um gigante político de renome internacional chamado Luis Inácio Lula da Silva.
Ao se afastar e depois maldizer Lula enquanto acusa Bolsonaro de tudo que é malfeito, Ciro poderá ver as duas canoas em que navegam no rio da política se afastarem e repentinamente se ver nas águas de um rio caudaloso, repleto de piranhas ansiosas por devorá-lo.
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