Já perdi umas tantas horas de sono com a temática, hoje não mais. Tenho para mim que o Brasil está conhecendo um novo fenômeno com o qual não estava acostumado e que passou a fazer parte de nosso cotidiano para sempre que é a extrema direita institucionalizada.
A configuração existe em todos os países ditos democratas, com ênfase no EUA com Donald Trump, passando pela civilizada France com Le Pen, Hungria, entre outros governos menos destacados.
Extrema direita é uma coisa, ditadura é outra coisa. Dentro das ditaduras, podemos citar a norte coreana, a turca a russa e a da Arábia Saudita, que tem o apoio dos EUA. Porém, governos extremistas de direita, como no caso do Brasil, operam nos limites da democracia, para eles tolerável.
É um fenômeno novo que não sabemos bem como lidar com ele. O que entendo é que a operação deles no Brasil está ancorada na agenda de costumes, que é bastante sensível e costuma fidelizar legiões de eleitores em todo o mundo. Temas como aborto, castração química, direito a possuir armas de fogo, casamento tradicional hetero, fundamentalismo cristão, formação marcial para crianças e jovens através de escolas militarizadas, nacionalismo exacerbado, utilização e divinização dos símbolos pátrios, homofobia e desprezo pelas populações autóctones, a defesa da família e a velha e esperta dialética entre o bem e o mal, mal este o comunismo.
A dialética sempre funcionou eleitoralmente no Brasil, mas não era como está sendo agora, de maneira doutrinária. Penso cá com meus botões o desastre que seria caso tivessem bons doutrinadores, intelectuais que se debrucassem sobre o tema e desenvolvessem teses sobre a importância da extrema direita para a salvação da família brasileira e do próprio país das garras do mal, novamente o comunismo, ectoplasma político sem materialidade e que assombra o cotidiano da população brasileira iletrada e fundamentalista.
No passado até tivemos aqui Plínio Salgado que com alguns Integralistas produziram alguma literatura doutrinária, mas com pouco sucesso.
O fenômeno do bolsonarismo é que ele convence 30% da população brasileira a votar no totalitarismo sem ter produzido uma linha doutrinária sequer.
Como explicar então a grande adesão das mulheres ao bolsonarismo. No meu entender é de simples compreensão. Essas mulheres fazem parte de um bolsão conservador localizado no militarismo, nas polícias e aparatos de segurança, nas seitas pentecostais e nos maridos e companheiros que defendem um estado falocrático e excludente.
Fico surpreso ao ver mulheres negras apoiando a candidatura Bolsonaro, mesmo após ele ter afirmado que seus filhos foram muito bem educados e que jamais se casariam com uma mulher negra. Essa mulher negra que apóia Bolsonaro o faz por outras vias doutrinárias, como a pauta cristã neo pentecostal. As mulheres militares, esposas de militares, mães de militares e de famílias militares e de membros dos aparelhos de repressão de estado, além de vigilantes civis e empresas de segurança, seguem o discurso bolsonarista, por convicção e em muitos casos por solidariedade ideológica.
A pauta de costumes é poderosíssima e nas mãos de grupos extremistas se torna uma arma imbatível. A simples menção a uma cartilha gay que seria distribuída nas escolas brasileiras fez um estrago na campanha do candidato petista Fernando Haddad em 2018, somando à surreal "mamadeira de piro*a", que em tese produziria gays em.massa desde o berço. Ameaças de ter obrigatoriamente a casa repartida com Sem Tetos, implantação obrigatória do ateísmo e o fim das igrejas e o comando comunista de Pequim e Moscou, coroaram o universo imaginário das fake news, que amplificado para mulheres cristãs, mulheres sem formação política e acadêmica, consolidou de vez o discurso bolsonarista ancorado na dialética do bem contra o mal.
Meninas vestem rosa e meninos vestem azul. O bordão limitado e cafona produziu um forte efeito nas hostes bolsonaristas, assim como o Capitão Imbroxável recém surgido nas comemorações do último 7 de Setembro. Tiro no pé, pois naquela multidão verde amarela, as mulheres constituindo mais de 50% do público presente, passam constantemente pelo desconforto causado pela disfunção erétil do parceiro patriota.
Enfim, as mulheres tornaram-se agentes políticos sem serem feministas, sem queimarem os sutiãs. Agora fazem parte desse exército totalitarista por se sentirem abrigadas e respeitadas politicamente, mesmo que com uma agenda homofóbica, o que é surpreendente. Elas encontraram uma bandeira para empunhar e lutar por ela. Essas mulheres não querem carregar bandeiras vermelhas, não querem discutir a igualdade na relação homem/mulher dentro do casamento, querem ir às igrejas e ter a garantia que seus filhos não se tornarão gays e que não serão estuprados nas ruas devido a leniência do estado.
Essas mulheres, desde sempre foram desprezadas pela esquerda. Nunca concordaram em participar de exaustivas reuniões do movimento feministas com suas incontáveis correntes ideológicas. Estavam flutuando placidamente no lago da sociedade enquanto que os pescadores atiravam suas tarrafas nós cardumes conhecidos.
Não existe espaço vazio na política. Esse exército de mulheres agora militantes e votantes sempre esteve bordejando na sociedade. Infelizmente foram atraídas por uma doutrina canhestra e rasa, e agora fazem uma enorme diferença no coeficiente eleitoral brasileiro. No jornalismo o nome para isso é "barriga".
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