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Eu Negro

domingo, 8 de janeiro de 2023

O ORÁCULO DE DELFOS NO PISCINÃO DE RAMOS

Tupamaro era conhecido no Piscinão de Ramos. Sempre tomando sua “geladinha”, acompanhada de torresmos, assistia o passar da vida sem estresse, no boteco do Amâncio, ouvindo samba-canção e olhando as pernas femininas que passavam pra lá e pra cá.
- Mas Tupã você é casado! Não fica bem admirar as mulheres passantes! Tupã então respondia: “Passantes e ficantes”, meu avô que Deus o tenha, dizia que era pra limpar as vistas.
Sempre foi o rei da síntese para qualquer situação e mais ainda, desenvolveu um método bastante peculiar de se comunicar, que era através de provérbios.
Era muito comum alguém chegar no bar reclamando de uma situação que não estava conseguindo resolver e ouvia do velho Tupã: “Quem está na chuva é pra se molhar”. Se chegava um outro contrariado pelas espertezas da esposa ouvia de imediato: “A mulher prendeu o diabo dentro da garrafa’, se a queixa fosse contra mulher braba, com certeza ouviria: “Com mulher de bigode nem o diabo pode”.
Aposentado da Marinha, onde passou a vida no convés da Corveta Heliodora como Cabo Mergulhador, Amâncio correu o Brasil e o mundo. Naquela mesa de bar, tendo a cerveja gelada como ícone sensorial do prazer, o velho marujo desfilava sua nanofilosofia a quem lhe procurasse e não tirasse o seu prazer cotidiano de flanar com os olhos.
Politicamente era anarco-comuna-conservador. Em sua mesa no boteco, espaço sagrado onde sua corte o reverenciava cotidianamente, Tupã analisava os eventos históricos com sagacidade e síntese. Em relação à Abolição da Escravatura, dizia que a Princesa Isabel deu uma moral mas no fundo deixou a galera na pista e vaticinava: “ Favor não se faz pela metade”. Em relação ao Grito do Ipiranga dado por Dom Pedro declarando a independência do Brasil, dizia: “O bom cabrito não berra, por isso que o Brasil vive nessa baderna até hoje”.
Por muitas vezes o povo procurava o oráculo da taberna para perguntar sobre assuntos do cotidiano, como por exemplo, uma possível greve dos transportes coletivos. Tupã respondia de pronto: “ Melhor prevenir que remediar”, que significava dentro do contexto de sua nanofilosofia, guardar dinheiro para se locomover até ao local de trabalho, através de carros de aplicativos ou moto táxi.
Fazia discursos contraditórios, como por exemplo, contra o consumo de bebidas alcoólicas, que segundo ele, destruía famílias e reputações. Quando era cobrado por beber diariamente replicação: “ Faça o que eu digo e não faça o que eu faço”, ou então ameaçava com “Passarinho que acompanha morcego amanhece de cabeça para baixo”.
Se alguém reclamava da polícia ou do governo, aconselhava em tom grave: “Em boca fechada não entra mosca”, ou então: “Quem fala muito dá bom dia a cavalo”. E avançava na ameaça com: “Cada cabeça uma sentença”, depois não venha aqui chorando! Quando ouvia a tréplica: – Mas seu Tupã! Estou sendo prejudicado pela polícia! Respondia de imediato: “ Se liga Zé Ruela! Barata esperta não atravessa galinheiro, um dia é da caça e outro é do caçador “. “Entendo que quem não chora não mama, mas quem fala o que quer ouve o que não quer”.
As mulheres mais próximas também iam à sua mesa para pedir conselhos sobre seus casamentos às vezes conturbados ouviam invariavelmente: “ Ruim com ele pior sem ele”, ou então: “Depois da tempestade vem a bonança, só não pode olho por olho, dente por dente, pois a esperança é a última que morre, só não pode tapar o sol com a peneira, pois quem ri por último ri melhor”.
Tupã encerrava sempre seu expediente diário no boteco quando o alarme do seu telefone celular tocava. Era a hora de voltar para casa, pois sua esposa estava prestes a chegar em casa, oriunda do trabalho
“Salvo pelo gongo”.

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