segunda-feira, 3 de março de 2025

O desfile das escolas de samba que você provavelmente não conhece

Acabei de sair do desfile da Mangueira como membro da consagradíssima Ala dos Compositores, a primeira desse tipo nos desfiles e fundada por Cartola. Não sei se sou merecedor mas me empenho por ser, sabendo que por ela passaram além de Cartola, Nelson Cavaquinho, Nelson Sargento, Zé Ramos, Hélio Turco, Leci Brandão (ainda membro), Carlos Cachaça, Saturnino Gonçalves, Zagaia, Xangô, Jamelão, Jurandir, Zé Criança, Geraldo da Pedra, e Gradim entre tantos outros.
Dentro de um desfile existem vários desfiles. Enquanto a escola passa desfilando sua imponência, centenas de pessoas trabalham esbaforidas para que nenhum contratempo aconteça ou então corrigindo contratempos que podem retirar pontos da escola. 
O desfile não permite teste drive para os carros alegóricos. Nos ensaios técnicos as atenções são voltadas para som, luz, evolução e cronometragem. No desfile prá valer as operações pré desfile são tensas: colocar os destaques no topo dos carros alegóricos, subir os componentes nas alegorias, verificar os obstáculos aéreos, bombeiros civis para prevenção de incêndio, hidratação dos componentes na concentração, dar os últimos retoques nas alegorias, conferir as fantasias das alas e garantir o melhor alinhamento possível das fileiras de componentes antes de entrar na avenida. Correndo por fora tem a afinação dos instrumentos da bateria e os testes de som p os intérpretes e da própria bateria. Existem ainda diversos detalhes que são infinitesimais como maquiagem da comissão de frente, efeitos especiais e por aí vai.
O resultado final é sempre consagrados, destarte um tombo aqui e outro ali, uma alegoria perder uma peça, abrir espaços entre as alas (buracos) e a escola ter que correr no final para não extrapolar o tempo. 
Geralmente todas as escolas passam bem, dentro do tempo mas sempre com uma pequena falha em algum setor. É o preço que se paga por colocar quase 4 mil pessoas em uma grande ópera à ceu aberto com músicos e cantores sem formação musical da academia, separados por esculturas gigantescas se movendo em direção ao final do desfile.
É no mínimo uma façanha. Portanto, independente do resultado, os componentes dessas agremiações colocaram seus corações em casa detalhe, em casa alfinete, nos ensaios de canto, nos ensaios de rua, nos ensaios técnicos e nas fantasias. Essas pessoas em prol das cores de seus pavilhões deixam a vida de lado e mergulham na obsessão da construção do carnaval de suas escolas. São as garbosas Velhas Guardas com seus bravos componentes octogenários, os membros das baterias e comissões de frente com seus ensaios extenuantes, poetas e compositores responsáveis pelo hino que a escola levará para a avenida, om seus ensaios extenuantes, passistas, casais de Mestre- Sala e Porta-Bandeiras que ensaiam de forma ensandecida e as deliciosas alas das comunidades onde o sangue da escola pulsa com mais vigor.
O esforço da direção da escola para controlar esse turbilhão é louvável. São centenas de profissionais assalariados na quadra de ensaios e no barracão de alegorias, abastecimento de bares a quadra, realização de eventos para arrecadação de fundos, controle de mensalidades, gastos com fantasias, viagens de representação etc. Tudo isso acontece o ano inteiro para que a escola desfile por 80 minutos para jurados imparciais vê inclementes. 
Ao fim somente uma será campeã e todas as outras amargarão a derrota e o ano investido com tanta fibra e dedicação.
Esses são os desfiles dentro do desfile. É como um iceberg onde só enxergamos a parte acima da superfície. Faz pó arte da nossa cultura e é sempre bom lembrar que todo esse espetáculo tem sua origem na Umbanda Omolokô e nos terreiros de Candomblé da Pequena África.

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