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Eu Negro

sábado, 17 de junho de 2023

O Negro e o Burguês Branco em Crise

Alguns brancos desconhecem ou fingem desconhecer que o real motivo do seu próprio fracasso na sociedade contemporânea, nada mais é que a extensão do fracasso do sonho capitalista vendido pelos EUA desde os anos 50. O sonho americano foi o canto de sereia que os governos estadunidenses venderam como propaganda política para as sociedades da periferia das economias centrais do capitalismo. O verdadeiro motivo escondia-se atrás de um biombo conturbado denominado Guerra Fria, onde Capitalismo e Socialismo disputavam ferozmente o alinhamento político desses países em desenvolvimento.
Nosso bravo cidadão branco, brasileiro, encantado com o canto de sereia do capitalismo, cresceu acreditando que o céu seria o limite. Sempre acreditou que bastava seguir a doutrina libertadora do grande irmão do norte, com suas metodologiaa de administração e gestão desenvolvidas por Adam Smith, Henri Ford, Peter Ducker, Steve Jobs e Bill Gates entre outros doutrinadores e empreendedores do sonho americano. 
Aprender, seguir e praticar esses conceitos, seria a base necessária suficiente que pudesse erigir e concretizar seu sucesso pessoal e profissional.
Como todo processo autofágico, o capitalismo se desenvolve e ao mesmo tempo vai se destruindo. A avidez insaciável por poder e lucro infinito faz a ciência desenvolver tecnologias cada vez mais sofisticadas, que se constituem como verdadeiros interditos para as pequenas e médias empresas por conta de seu elevado custo. Sendo assim, o sistema capitalista vai acumulando cada vez mais poder político e financeiro nas grandes corporações multinacionais, enquanto sufoca de maneira inexorável o pequeno empreendedor que fenece sob os grilhões insensíveis do mercado financeiro.
Como se envergonha e não pode sentir orgulho do próprio fracasso, o cidadão positivista branco e conservador de meia-idade, naufraga em seus próprios sonhos de enriquecimento. Precisa desesperadamente encontrar alguém responsável pelo seu infortúnio.
Oriundo da filosofia da branquitude, onde a raça branca, o ser branco é o padrão universal de sucesso, eficácia e poder, o bravo cidadão branco já agora um náufrago no mar do desespero, encontra consolo nos ecos irradiados pelo extremismo político. 
O discurso extremista afaga seu ego erodido, consolando suas quimeras e sonhos de restauração social. O bravo caucasiano abraça então a causa que promete lhe devolver os dias de bonança e glória de sua pátria, revigorando a economia do país, resgatando os bons costumes, valorizando o militarismo e lutando incansavelmente contra o grande inimigo da pátria e da família que é o famigerado comunismo.
O cidadão branco de meia idade entra na segunda onda de sonhos impossíveis. O primeiro foi a possibilidade de se tornar milionário através das leis do mercado com o capitalismo, missão na qual fracassou vigorosamente . Agora com a vida em frangalhos tenta restaurar sua vida desagregada navegando nas águas turbulentas e frívolas do nazifascismo. 
A virada de chave deu um nó na cabeça do exaurido homem branco. Ele agora deixa de ser somente um privilegiado na sociedade capitalista eurocêntrica, para se tornar um guerreiro militante contra os representantes da etnia negra e das minorias. O fracasso de sua vida não foi decorrente de suas crenças vãs e de um modo temerário de gestão pessoal e profissional. Mas sim pelo fato do povo negro periférico viver às custas, segundo ele, das políticas assistencialista do estado, que novamente segundo ele, não deveria dar o peixe e sim ensinar a pescar. Logo ele que quando nasceu recebeu um barco novinho em folha, modernos equipamentos de pesca, professor particular da arte de pescar, um lago particular herdado de seus pais repletos de peixes e a venda dos nesmos garantida para o abastecimento dos supermercados de sua família.
A crise endêmica do capitalismo contemporâneo interrompeu o ciclo virtuoso de acumulação de capital da classe média, nicho referencial da branquitude. Processos modernos como a automação e o fenômeno da rede mundial de computadores, a Internet, transformou o parquinho dos burgueses em uma terrível arena competitiva. Antes o burguês explorava a humilde costureira negra da comunidade que costurava roupas destinadas a classe média. Agora as ex-madames residentes nas regiões privilegiadas das cidades, compram suas roupas nas gigantes do e-commerce como Shoppe, Shein e Ali Babá. O burguês que antes vivia no fausto da exploração da força de trabalho da massa negra, viu seu negócio ruir por conta da concorrência "desleal" dos “malditos amarelos”.
 Enquanto os chineses se matavam  de trabalhar em condições sub humanas nas pastelarias da cidade,  estava tudo bem, tudo estava em seu lugar. Mas assim como os negros, os chineses comunistas são responsáveis pelo fracasso do branco burguês.
Negros e amarelos são agora os inimigos viscerais do neofascista inflamado pelo canto de sereia do nazifascismo extremista 
Os negros são um caso à parte de acordo com a ótica enviesada do branco burguês. Ele os considera doentes, preguiçosos e afeitos ã feitiçaria. São malandros e nunca valorizaram os estudos insiste. Os negros no seu entendimento gostam mesmo é de samba, futebol e cachaça. O pobre burguês só consegue enxergar o mundo de acordo com o que conhece e geralmente seu conhecimento é bastante limitado. Para ele os 350 anos de escravidão que ocorreram no Brasil faz parte de um passado que há uito se perdeu nas brumas do tempo. Defende que com o fim da escravidão as chances se tornaram iguais para todos e os que se empenharam conseguiram se estabelecer na sociedade. 
Não é incomum que se ouça ressaltar o esforço de seus antepassados que vieram da Europa fazer a vida no Brasil. Narra com orgulho as dificuldades que seus bisavós enfrentaram no passado quando aqui aportaram com uma mala surrada lotada de esperanças.
O burguês não consegue refletir sobre as condições de chegada dos bisavós dos negros de sua mesma idade. Chegaram acorrentados, seminus, considerados sem alma, expostos em praça pública para serem vendidos em leilões como gado. 
O burguês branco oculta a divergência étnica que ocorreu entre sua família e a família do negro de sua idade no passado. Ele esquece, ou finge esquecer, de dizer que seus antepassados europeus receberam terras e insumos agrícolas subsidiados do governo brasileiro dentro de um processo político governamental de branqueamento da raça brasileira. Também não cita que seus antepassados compraram no mercado negreiro os antepassados do homem negro da sua idade atual e que os fizeram trabalhar gratuitamente até à morte como escravos e assim produzir a riqueza dos seus antepassados brancos.
O burguês branco narra com orgulho a saga de seus antepassados e o projeto de estudos de toda a sua família, mas não tem coragem de dizer que seus antepassados não permitiram que os negros escravizados de propriedade de sua família pudessem estudar,  gerando   inúmeras gerações de populações negras não alfabetizadas, completamente apartadas do conhecimento acadêmico e por assim ser tornaram-se absolutamente vulneráveis. 
A enorme perfídia epistemológica gerou as imensas assimetrias raciais e sociais que hoje incidem sobre a população negra brasileira travestidas de nornaludade pelo imanente racismo estrutural.
Retornando ao nosso burguês branco neofascista, ele culpa tudo e todos pelo seu ocaso existencial. Os negros, os chineses, os comunistas, humanistas, os candomblecistas as feministas e se puder até os sambistas por seu retumbante fracasso financeiro e social. Envergonhado e necessitando mostrar para a família que possui alguma utilidade enquanto cidadão, torna-se um quixote moderno a declarar um patriotismo distópico inserido no conjunto de movimentos sociais extremistas. Combate firmemente qualquer iniciativa progressista e democrática oriunda da sociedade, investindo contra elas apoplético lança em punho, como o velho personagem de Cervantes investindo contra seus moinhos de vento.
Com as lufadas do nazifascismo sendo sopradas através da Internet, junta-se a milhares de outros iguais e passa a desfraldar um movimento extremista com viés nazifascista, positivista, falso patriótico e religioso. Quando declara com ardor o compromisso com os símbolos nacionais, assim como com os ícones sagrados, rejeita o marco jurídico soberano da Suprema Corte, pregando abertamente a necessidade de um golpe de estado, instando a emulação das forças armadas através de uma intervenção militar direta com o fechamento do Congresso Nacional e o fim das garantias constitucionais democráticas.
Para garantir a manutenção do encarceramento em massa e o genocídio da juventude negra, defende a aplicação de instrumentos inconstitucionais pelos órgãos policiais como política de repressão de estado e a eliminação física pura e simples da etnia negra. Acredita que a ação da necropolítica governamental seja a panacéia para o fim da violência e de todos os males que grassam na sociedade. Imputa aos negros o estado de violência social mas não compreende que está dirigindo na estrada da vida olhando somente através do parabrisa, esquecendo-se de observar o passado, ou seja, olhar também pelo retrovisor.
Quem criou o ressentimento no povo negro foi o branco. Quem esmagou o sonho dos negros foram os brancos. Quem humilhou, torturou, estuprou, escravizou e matou o negro foi o branco. Tantas mortes nos navios negreiros, tantas mortes nas plantações, no eito, tanta morte nos quilombos e em todos os lugares, enfim, todos os infirtúnios infligidos ao povo negro desde o século XV até hoje, são responsabilidade direta dos brancos.
A história do negro no Brasil tem mais tempo de escravidão que de liberdade. O destino do negro no Brasil sempre esteve ligado com a morte por execução e por desesperança. O viver do negro no Brasil sempre significou humilhação, encarceramento e genocídio.
A presença do negro no Brasil é eivada de desconfortos e desconfianças. Ser negro no Brasil significa existir com um atestado natural de eterna burla de civilidade. Significa que a vítima histórica que deveria passar por reparação, sofre sim preconceito e opressão. 
Ser negro no Brasil é aceitar o paradigma naturalizado do branco protagonista, do branco vencedor, aquele que desenha e escreve a história. Quem se levanta contra essa matriz eurocêntrica com seus proselitismos absurdos é taxado de racista só contrário. É a mesma coisa que a pessoa debilitada transfundir seu sangue para o sadio.
Nesses 523 anos de Brasil, passamos mais tempo de escravidão do que de liberdade. Somente no ano de 2276 os negros brasileiros completarão o mesmo tempo em liberdade que o mesmo tempo passado sob a escravidão. Até entao estremos perdendo feio para a escravidão.
O burguês branco não pensa nessas coisas ridículas segundo sua ótica. Para ele o discurso por reparações e antirracista é pensamento de negro derrotado, ou seja, na verdade considera tudo isso um grande mimimi. 
Quem sofre discriminação é o negro, quem trabalha nos piores empregos é o negro, que estuda nas piores escolas e é atendido nos piores hospitais é o negro. Quem é parado pela polícia é o negro, quem morre nas favelas é o negro, quem chora seus mortos pela violência são os negros.
O branco criou o negro triste, o negro miserável e o negro revoltado. Ninguém nasce para ser assim. Ninguém merece um destino tão cruel, ninguém pode ficar impune diante de tanto pecado, tanta perversão. Se há um Deus e certamente existem deuses no Orum nos aguardando e professando a justiça divina, esses pecados da branquitude não passarão incólumes, jamais serão perdoados. Serão sim cobrados e a paga será terrível, pois nunca se sofreu tanto por tão pouco. Todo esse sofrimento que perpassa os séculos, foi criado para construir a vida de conforto e privilégios do branco burguês sobre os escombros antropológicos da alma negra 

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